segunda-feira, 21 de dezembro de 2009

EDWARD HOPPER: RETRATOS DO INIDIVIDUALISMO URBANO.

Círio J. Simon

Não existe solidão maior que a companhia de um Paulistano.

Nelson Rodrigues.

RESUMO:

Ao adentrarmos no estudo da obra de Hopper devemos compreender que sua produção é pautada por diversos aspectos psicológicos e sociológicos da construção de um novo inconsciente coletivo do homem urbano do início do século passado. A vida nas grandes cidades pós-primeira guerra abandonava os últimos resquícios culturais do período social urbano colonial vitoriano. A quebra da bolsa de valores de Nova York no período do entre guerras e a impressão de impotência do trabalhador urbano jogado fronte a um mecanismo macro-financeiro fez fortalecer os sindicatos trabalhistas que marcavam em tintas vermelhas o período da depressão norte-americana. As idéias e teorias de Freud se popularizavam ao passo que o homem deixava de ser visto como um ser puramente social e tornava-se, cada vez mais, um ente que se posiciona e reage de modo particular e pessoal perante a sociedade. A massificação impessoal urbana aos poucos destruía os núcleos de convívio comum, mais próprio, neste momento, das pequenas cidades rurais. O individualismo social, a perda da identidade coletiva e a falta de esperança no futuro comunitário transformavam fortemente o plano sociológico de época. Nesta conjuntura cultural Edward Hopper encontrou terreno fértil para o florescimento de sua arte. Sua obra é impregnada dessas características, forjando assim um retrato fiel da sociedade norte-americana do alvorecer do século XX.

PALAVRES-CHAVE: Edward Hopper, Arte, Urbanismo, Norte América.

1 CONTEXTO HÍSTORICO

A sociedade sofria marcante reformulação no período entre-guerras. Como conseqüência do esforço de guerra, a Europa vivenciara um surto científico e tecnológico. As idéias do alemão Karl Marx ganhavam forças sob a luz do luar do oriente europeu. As classes operárias européias, já bastante castigadas pelo esforço de guerra e pela falência do sistema monetário industrial imperialista, vislumbravam tais idéias como uma nova possibilidade de sociedade mais igualitária.

A revitalização da indústria norte-americana fomenta uma nova onda de imigração de mão de obra para o novo mundo. Essa esculpia a marcantes cinzeladas um novo perfil para os antigos centros urbanos estadunidenses. Trouxeram consigo, esses imigrantes europeus, um pouco mais que suas ferramentas de trabalho; em seu rol de pertences também existia um privilegiado espaço para sua bagagem cultural. Muito desta constituída de hábitos e costumes, alguns deles fundamentados no berço do comunismo e do anarquismo. Esse aparente idílio de igualitarismo na verdade enraizavam no concreto urbano os primeiros brotos do individualismo metropolitano. Contudo, por se tratar de uma diáspora da classe trabalhadora, a arte norte-americana ainda assim se mantinha relativamente imaculada ao “avant-guarte” europeu. Na mesma época surgia nos subterrâneos da 5° Av. em Nova York um grupo de artistas que, com seus pinceis, a traços ágeis, delineariam os tons de uma nova vertente do realismo fotográfico, galgada sobre o seletismo da realidade representada. Esses ficaram conhecidos como o grupo do “The Eigth” e grande parte de seu trabalho era dedicado ao retrato poético dos maginalizados nos guetos de Nova York. Fruto deste embrião artístico fecundado nos porões da Times Square, a arte de Hopper torna-se um forte expoente da identidade cultural urbana norte-americana.

2. A OBRA

Um marco importante na vida de Edward Hopper foi a aquisição de seu primeiro veículo, tal fato não só veio a ser motivador do encurtamento das distância, mas também um propiciador de expansão dos seus horizontes culturais. Junto à sua esposa Josphine, costumeiramente embarcados em seu velho Dodge, experimentaram sabores e impressões que iam do frio gélido da tundra canadense ao tórrido calor dos desertos mexicanos. Essa viagem “On the Road” não só evidenciou a formalidade da solidão da vida moderna, mas também propiciou o contato com demais intelectuais da incipiente cultura underground, entre eles o próprio beatnik Jack Kerouac. A experiência “na estrada” que Hopper vivenciou, junto a Kerouac, evidencia a relação de individualidade e solidão do trabalhar ante ao serviço e suas possibilidades. Fomentado o sentimento de individualismo do ente, imerso na era pós–industrial, ante ao universo que são mutuamente abandonados(Fig. 1 e 2).



(Fig 1. Estudo preliminar, Gasolina - 1940)

(Fig 2. Gasolina.)

Nessa senda Hopper percebeu que as estradas não como um meio de união entre dois centros urbanos, mas sim uma via física que reproduzia involuntariamente a falta de comunicação entre, e nos, diversos núcleos familiares de uma cidade. Tal experiência leva essas vias a se tornar um série de crônicas visuais de “Não Lugares”, pontos onde a história e a identidade são negadas. Quarto de hotel, evidência a solidão no espaço urbano sem memória(Fig. 3). Junto a esses está inerente hotéis, aeroportos e demais vais que por não possuírem memória própria, dicotomicamente, segundo Salavisa, se apresentam em um caráter universal e familiar ao viajante.

Neste cenário efêmero se dá a obra de Hopper, em um ambiente transitório edificado por uma sociedade onde a comunidade não é mais tão importante quanto o serviço e que o “Eu” que alheio percebe não mais que o universo imediato, contudo nada registra. Em Night Hawks, fica presente não só o individualismo das pessoas retratadas “que não se olham” também a intenção de interação predatória de serviço prestado. Fica evidente a exclusão de todas as demais pessoas das ruas da cidade de Nova York que não tem a ver com o momento(Fig. 4).


(Fig. 4. Night Hawks)

A falta de uma identidade fomenta o sentimento quase nômade de constante mudança de sitio. Lembrando a frase de um dos influenciadores da obra de Hopper, Baudelaire: creio que estaria sempre bem onde não estou. Neste contexto se da a necessidade de formação de critério pessoal interno e por isso a intenção do recolhimento monástico a espaços urbanos impessoais a fim de satisfazer a compulsão a reflexão. Tal melancolia e solidão criam o contra-ponto, impulsionam e perspectivam o raciocínio individual. Aspectos como direcionamento iluminação e a mínima presença de decoração são normalizados e isolados projetando o individuo em sua busca. Toda a possibilidade de aprisionamento do ente no local onde ele se encontra é removida, ressaltando assim não só o distanciamento local, mas também, o mental do ser que busca por respostas pessoais a suas indagações. Em Morning Sun vemos a impessoalidade do ambiente na completa falta de decoração do quarto, as paredes são nuas, desprovidas mesmo de tinta, não existem cortinas ou persianas. Tudo que roube a atenção e não seja essencial a solidão própria para a reflexão é subtraído.



Hopper mantinha um relação explorador de espaços urbanos, entendia o individualismo das metrópoles, contudo não era um aventureiro desvairado. Mas sim uma pessoa próxima aos ideais fomentados pelo individualismo da geração pós-guerra beatnik, altamente intelectualizada, que buscava o isolamento pessoal e como decorrência dos fatores sociais anteriores abandonara por vez o sentimento de coletividade. Tais sentimentos podem também ser vislumbrados em sua obra. Em Approaching a City mostra não só um momento individual de percepção do trem que está prestes a rasgar as entranhas da cidade via subway adentrando em Nova York, como também revela a ânsia por ser jogado um desconhecido paradoxalmente já cotidiano(Fig. 6).

(Fig. 6. Approaching a City)

Muito do ferramental técnico de Hopper era constituído por artifícios arquitetônicos: expressividade de traçado, noções de perspectiva arquitetônica, simplificação de representatividade tanto formal como de luz-sombra e técnicas de apelo psicológico para a construção de sentimentos espaciais. Fomentando tais sentimento, segundo o Dr. Círio Simon, Hopper usa a técnica média-extrema-razão. Onde o primeiro plano é deixado vazio para evidenciar amplitude, solidão e desacolhimento(Fig. 7). Na representação podemos sentir o vazio em primeiro plano. A técnica pode vista nas proporções guardadas no quatro. Hopper ao privilegiar o espaço vazio no centro remete o interlocutor a melancolia da inexistência de forma(Fig. 9). Essa relação com a arquitetura gerou forte crítica de seus contemporâneos, sendo por algum tempo tomado pelos erodidos como um artista menor. Condição que só veio a mudar com o advento posterior da Pop-Art.




Tal relação com a Arquitetura não se limita as técnicas utilizadas, a própria arquitetura vernácula americana foi alvo de sua obra(Fig. 9). Essa como cenário de pano de fundo para a relação do indivíduo remetido a busca da individualidade ansiada pelo seu ego que se contrapõe ao trabalho coletivo em um centro urbano. Tais imagens sempre reforçam o parecer da busca individual do trabalhador abandonado ao seu inconsciente. vemos novamente o vazio valorizado, assim como o individuo remetido a não produção e ao próprio “Eu”(Fig. 10).



Mesmo os espaços urbanos públicos retratados pelo artista fica presente tais características psicologias do ente contraposto ante ao social, que em sua relação trabalhista com os demais membros da sociedade tem em ápice a negação de seu ego. Essa é a evidência máxima da perda da credibilidade das grandes metrópoles no futuro prometido pelo “Americam Way of Live” que prega que o individuo é super valorizado e libertariamente onipotente ante a sociedade, com resquício metabolisado dos ideais germinados pela mão de obra anarquistas advinda no entre-guerras que pregavam a edificação do “Eu” supramoral e suprasocial . Em New York Movie Hopper mostra a trabalhadora valorizada em segundo plano que presa a suas introspecções espera o fim da secção(Fig. 11). Em Barbershop o cotidiano de uma barbearia, onde o tempo se mostra parado na metáfora do relógio partido pela luz na parede(Fig. 12). Hopper retrata o barmen desamparado na solidão da passagem pública.(Fig. 13).




O artista também percebe o inicio da desconstrução da família nuclear em centros urbanos. Antes em pequenas cidades tendo sido tomada por cerne dos valores americanos, agora delegadas a simples grupos familiares que dividem e compartilham o mesmo lócus. Presos ao próprio individualismo compartilham o local, porem não existe evidência de interação entre os casais que habitam os mesmos espaços. Unidos somente pelo local e não pelas vidas, o artista demonstra que mesmo acompanhado o ser urbano está preso ao condicionamento das estruturas sociais vigentes na super valorização do ego. Em Room in New York vemos o casal que dividem o mesmo espaço porem novamente não interagem entre si(Fig. 14). Em Hotel by a Railroad novamente a permanência física porem o distanciamento mental do local(Fig. 15). Mesmo em cenários de relativa intimidade fica evidente que apenas as pessoas estão no lugar e seu psiques escapam para outros locais(Fig. 16)




3. CONSIDERAÇÕES FINAIS

Destarte, Hopper tece uma radiografia da sociedade norte-americana da primeira metade do século passado. Para tal feito compõe maestralmente um mosaico de pequenos, mas significativos, recortes da vida urbana. Em sua obra, firmemente pautada pela então ascendente teoria do inconsciente assim como pelos reflexos sociais de duas arrebatadoras guerras o artista nos remete ao cotidiano urbano. Contudo essa não é uma visão externa ou estereotipada de metrópoles que galopam a ágeis passos em dinamismo, progresso e velocidade; mas sim em um cotidiano vivenciado pelo ser urbanóide comum que massificado pelo sistema social tenta escapar física ou psicologicamente do local monótono onde se encontra, reforçando assim o individualismo do ente que se defronta com a sociedade que oprime seu ego. Tal obra é impressionantemente despida de estéticas primordiais ou técnicas refinadas o que delega ao conjunto da obra um traço de deliciosa humanidade. O artista também nos desequilibra ao evidenciar que mesmo acompanhado o ser humano tem a estranha propriedade de permanecer só, assinalando a tímidas pinceladas que solidão não é uma questão de companhia. Sua obra permanece atual, análise mais criteriosa da obra de Hopper pode vir a propor respostas edificantes para aqueles que tem como objetivo um planejamento urbano e social mais justo e humanizador.

quarta-feira, 14 de outubro de 2009

Huitzilopochtil, o Colibri Canhoto; Deus dos Guerreiros Esquecidos.





Nessa semana me deparei com um pequeno, mas recorrente, grupo de perguntas: Afinal, quem foram os Astecas? Qual eram suas técnicas, artes e mitos?

Ao iniciar o tratamento desta incomoda coceira intelectual, minha primeira descoberta foi a decepcionante conclusão do quanto não damos a devida importância a essa magnífica civilização. Existe realmente muito pouco escrito sob; e quando feito comumente tal assunto é abordado sobre forma fantasiosa, oscilando entre mitificações de contatos extra-terrestres e teorias apocalípticas. (Nada contra o pessoal da “nova era”, mas por vezes eu acho que o que eles tratam por “oculto” não é mais que eclipsar a beleza e a grandiosidade do espírito humano). A segunda foi a maravilhosa descoberta de um grupo social fomentador de uma cultura cujos ciência e arte era riquíssima e deliciosamente original. Uma sociedade repleta de concepções de universo bastante particulares, soluções imaginativas, iconografia fantástica, posuidora de medos, anseios e esperanças extraordinários ante a uma realidade desafiadora.

Mestres na solidificação da improvável teoria dos “sentimentos mistos”, sem dúvida, conheciam o ápice do termo culto sublime. Diderot, em uma carta a Sophie, indica esse termo como um misto entre o êxtase e o terrível. Para tal descreve uma cena onde uma linda mulher semi-nua oferece doce néctar alcoólico servido dentro do sangrento crânio de nosso inimigo. Essa imagem mental, apesar de toda valorização dos sentimentos antagônicos, tem um impacto mental pífio ante o ritual de sacramento de um rei em Tenochtitlan. Onde cerca de 70 mil prisioneiros foram sacrificados em um ritual que arrancava-se da cavidade tórax seus corações, ainda palpitantes, para serem oferecidos para Huitzilopochtli, o colibri-canhoto, Deus da guerra e dos vencidos. Após mortos, corpos pintados eram atirados aos espctadores sendo avidamente devorados por uma multidão em êxtase. Suas peles eram esfoladas e utilizadas como uma segunda pele do cidadão, que a usava até que apodrecesse, neste meio tempo o Asteca assumia a personalidade da vítima, e como esse deveria ser tratado pelos demais.

Eram grandes arquitetos que artificializam o terreno com pirâmides tão grandes como montanhas, transformando a paisagem tropical. Possuíam aquedutos, dominavam técnicas de irrigação, cantuária, orientação solar, edificação sobre palafitas a ponto de Tenochtitlan, edificada sobre um lago, foi classificada por arqueólogos como a Veneza do antigo Novo Mundo. Artistas singulares possuíam uma linguagem representativa pictórica rica e magnífica, muito da qual ainda não formamos concepção imaginativa adequada. No campo das ciências eram capazes de uma leitura astronômica primordial, elaboraram, embasados nesse conhecimento, um calendário mais preciso que o nosso atual gregoriano. Para tanto desenvolveram um linguagem matemática autentica, solidificada em um cordão com nós, que usavam para realizar cálculos e transmitir mensagens em meio as florestas do mundo pré-mexicano.

Tal civilização certamente não foi dada gratuitamente a selvagens por piedosos visitantes do espaço! Fora conquistado com o melhor que reside em nossas almas: esperança e agonia, erros e acertos, bondade e crueldade, ciência e fé, arte e destruição, trabalho e martírio... Somente assim enxergo como esse nômades realizaram no hiato de 200 anos o que Romanos e Egípcios levaram mais de 1000 para fazer. O mais irônico disto tudo é que a mesma cultura que os glorificou os destruiu. Quando Cortez desembarcou no novo continente tal fato catastroficamente coincidia com a profecia do retorno de Quetzalcoalt. Divindade branca de olhos azuis e barba longa que chega para ficar e dominar o mundo para sempre...

domingo, 11 de outubro de 2009

A Descoberta de Certos Centauros...



Algumas coisas que tenho escutado desde a minha mais tenra infância: -O seu florete não é uma bengala! –O arco de seu violino não é uma vara! –O escalímetro não é uma régua!


Após alguma resistência natural ao pragmatismo da oportunidade; essas afirmações se transformam em um ritual canônico incontestável. Ao ponto da imediata repreensão a qualquer um que ousar profanamente assim os utilizar. Por fim se são fomentadas a completa repulsa a graciosa e flexível bengala, a utilidade incontestável do prolongamento do próprio braço e a praticidade retilínea e milimétrica. Assim tais objetos tornam-se como centauros que apesar de uma poderosa natureza eqüina possui o artificialismo da virtude erudita do intelecto humano. Quando os utilizamos tais equipamentos, nesse cenário dualístico tomamos as vestes de personagens como Ájax, Enéias, Teseu, Aquiles ou Jasão ao serem instruídos por Quiron.


Destarte, eis o que nos separa das demais criaturas da natureza: A certeza em que devemos negar nossa parte eqüina! Não obstante, talvez o mais fabuloso de Quiron seja justo sua metade cavalo...

sexta-feira, 9 de outubro de 2009

O Barroco e os louros de uma improvável vitória.




Bernini ao esculpir Apolo e Dafne captura toda a essência do Barroco. Tanto em movimento, dramaticidade e antítese do período. Contudo, aqui, não quero me prender nas características sociológicas históricas do momento, mas sim na reflexão sobre mito.

 

Se você não lembrar, Apolo, após a derrota de uma hidra infla mais seu, já então monumental, ego. Desta vez a ponto de causar grande transtorno no Olimpo. Ao passo de importunar o filho de Diana, o Cupido que preparava seu arco. Apolo lhe fala em tom arrogante: “Garoto, você é cego, como pode possuir também a mesma arma que eu? Guarda-te a sua arpa e te limite as liras”. Neste ponto a divindade retruca: “Minhas flechas nada matam, contudo podem lhe causar dor pior que a morte.”. Como deliciosa vingança lhe prega uma peça, uma justiça forçada.  O Cupido flecha seu coração por Dafne e Dafne ao contrário por ele. A virgem sem mais ter com quem lhe ajude recorre ao seu pai. Peneu lhe tira as esperanças: -Se Apolo a quiser, ele provavelmente a terá. Contudo esse recorre a um encantamento, visto o tamanho da repulsa da rapariga ao seu algoz, feitiço que iria assim que Apolo encostar a seu corpo a transformar em um Loureiro. E assim o foi feito, ao toque do Deus a ninfa se transforma em uma robusta árvore. Não podendo mais possuir sua fonte de desejo Apolo toma um ramo de seus galhos e adorna sua cabeça. 

 

Fica aqui o pensamento, será que os louros da vitória não são mais uma lembrança do que perdemos, ou deixamos de ganhar, ao chegar em nossos objetivos? Antagonismo Barroco a parte, ainda é uma pergunta pertinente em nosso dia-a-dia. O que me assusta é a aparente atual aceitação da música de Bach e a temporalidade da poesia do velho Gregório. Me pergunto, o que perdemos entre a alma e mente desta vez?

 


segunda-feira, 21 de setembro de 2009

Teoria do Desenho.

Para o senhor Zuccari, é no campo da expressão gráfica pictórica onde o ente inteligente ao representar o universo particular aproxima-se, através de lampejos de criatividade, do ato divino da criação. Necessidade natural ao ímpeto do ser que reflete ante ao universo, que constantemente o desafia e desequilibra, impelindo o individuo a codificação deste universo em forma de signos a fim de representa-lo e se apropriar do mesmo. Tal processo acompanha a humanidade desde os primeiros homens a se posicionarem de forma auto-consciente ante a um mundo até então essencialmente natural. O autor ainda disseca a criação do desenho em duas fases distintas, esse sendo dividido em um processo tanto interno quanto externo. Sendo a primeira fase muito mais compromissada ao mundo platônico, onde as idéias e sentimentos ditam a ordem, já o externo um procedimento mais próximo às normas e técnicas vigentes. Para Lapuerta, o desenho apresenta-se como uma ferramenta imediata ao grafismo sistemático de uma idéia. Voltando a suas idéias, as já tomadas por Zuccate, Lapuerta acredita que um desenho principia de modo livre e criativo através de esboços que gradativamente toma forma e cresce em técnica à medida que se aproxima de uma fase mais reflexiva, estudada e padronizada, ao passo que se aproxima da arte final.

Para Felibien, o desenho é uma representação presente do pensamento, assim evidenciando o processo mental inerente à técnica. Neste hiato, entre técnica e idéia, são germinados os fundamentos do croqui, esse servido como ponte que aproxima a dicotomia entre as etapas externa e interna. Nesta fase, as principais idiossincrasias do desenho são evidenciadas e elaboradas, mas contudo ainda não guarda o rigor geométrico fortemente consolidado. Segundo Lacombe, o exercício dos croquis ainda faz parte do processo de estudo da produção gráfica final, onde o artista pode testar várias nuanças de diferentes conceitos sobre mesma idéia original. Para Watelet, tal processo deve ter agilidade em sua execução a fim de não se afastar do ponto de criação original, logo assim tal execução não deve ser amarrada a demonstrações excessivas de técnica, sob pena de perda de foco conceitual. Segundo esse autor, antes da arte final, estes lampejos de criatividade devem ser estressados ao máximo com o frenetismo do fogo em uma fogueira que consome de modo ágil as possibilidades da idéia original. Guardando para a fase de arte final as mais altas demonstrações de habilidade técnica.

A elaboração dessa técnica remonta ainda da era das sociedades que viviam no nomadismo primitivo. Tais representações marcavam a apropriação e o planejamento do cotidiano vivido por esses homens. Tal processo de apropriação de um universo imaginário representava muitas vezes um diálogo com o místico e a tentativa de materialização de algo ainda existente somente um plano meramente ideal. Por horas, também, tais grafismos representavam a tentativa de perpetuação de acontecimentos e personalidades, tendo como legado final, inconsciente talvez, o grão inicial da história coletiva e a preservação das mais variadas técnicas apreendidas e planejadas por seus ancestrais. Mesmo essas sociedades tendo fielmente se mantido consolidadas nas tradições orais sempre existiram variados diagramas rudimentares sobre as organizações de alguma idéia preciosa a esse clã. Não raramente as edificações primitivas eram riscadas no chão, evidenciando a necessidade de uma abstração representativa. Tal técnica permitia não só maior segurança em execução como um constante aprimoramento das técnicas construtivas e por extensão das técnicas de codificação mais abstratas. Abandonado a fase pré-histórica, os egípcios desenvolveram plantas esquemáticas baseadas em quadriculas codificando as principais marcações dos fundamentos das edificações. Esses eram gravados em escala em pedras que organizavam a execução da obra. Neste canteiro se fazia necessário a constante regência de um arquiteto encarregado de compor a integração entre os diferentes grupos de trabalho. Já na Grécia, abandonado o conceito de codificação de uma planta, a presença do mestre tomava o papel do projeto desenhado, esse fazia o passo intermediário entre o criador, que passava as instruções de modo oral, e a criação da obra, que era executada por homens hábeis nas funções de edificar o projeto. Tais codificações se mantiveram primitivas, e muitas vezes sendo mera ferramenta de organização pessoal, até os idos da Idade Média, só experimentando maiores modificações com a chegada do renascimento cultural, o que está atrelado ao fato de terem surgido melhorias nas técnicas geometrias. Contudo, Harvey acredita que neste ínterim as técnicas representativas utilizadas pelos arquitetos de época já eram relativamente sofisticadas e extensas. Para Bucher, o trabalho de codificação de alguns arquitetos medievais já era suficientemente elaborado, existindo diferentes categorias de diagramas esquemáticos que serviam não só para a orientação pessoal como para execução do projeto. Tais esboços eram usados também como ferramenta de marketing a fim de arrecadar custos para sua execução, assim como pedra de contrato de sua edificação.

Quando abertas as portas da renascença, o arquiteto percebe a necessidade da competência de utilizar as representações gráficas para projetar e o mais valia em relação aos que simplesmente executavam um projeto concebido em tempo de execução. Tal habilidade comum aos artistas, escultores e arquitetos criou uma casta de indivíduos que se distinguia dos demais membros da sociedade renascentista; sendo esses alavancados por uma propriedade intelectual, a capacidade de codificar e expressar um ente existente somente em um plano abstrato em algo fisicamente apropriável. Tais obras marcavam o passado, evidenciavam tendências em voga, orientavam o cotidiano e projetavam o futuro; criando assim uma nova classificação ao desenho que não era mais simplesmente tomado por uma representação de uma linguagem, mas também agora era visto como uma projeção de uma idéia criativa transformadora da realidade.

Com o início da era da expansão colonial, os impérios não só exercitavam domínio político sobre as colônias, mas também ditavam o que era aceito como culturalmente correto. Tais regras muitas vezes eram difundidas através de diagramas e desenhos a fim de transportar adaptações e ajustes entre os dois mundos. Já nesta época o croqui e o esboço eram tomados como ferramenta de expressão criativa. Tal distinção já era empregada na escola de Belas Artes de Paris, onde croquis e esboços eram usados para admissão e avaliação de seus candidatos; firmando novamente a diferenciação entre esses esquemas usados como estudo de linguagem e a arte final, a obra propriamente executada. Assim fortalecendo a distância entre o processo criativo de tempo de projeto e a execução técnica da edificação da obra. Mesmo que por vezes justifiquemos ter o projeto já plenamente definido em um plano ideal, muito antes de iniciar o primeiro esboço ou traduzirmos este em croqui, a ausência deste condiciona a técnica e o grafismo empregado neste é um processo pessoal de transcrição para a representação de uma realidade pouco definida.

Ao iniciarmos um esboço não fazemos mais que tirar o projeto de um plano ideal e jogá-lo ao mundo. Para a execução de tal transcrição, se faz necessário não só o primor técnico, mas também o fortalecimento de todo um marco teórico e filosófico. Ao estudarmos os fundamentos teóricos de arquitetos como Wright, esse deixa claro que toda a obra deve ser fundamenta em a definição de objetivos e assim criar uma memória do projeto. Tal processo é guiado por condicionantes como orientação, topografia, custo, histórico, etc. Os primeiros esboços em arquitetura são carregados pelas impressões pessoais do arquiteto sobre a aferência destes condicionantes pelo arquiteto gerando um grafismo de números e apontamentos sobre a obra. Gerando a primeira perda de informação entre o ideal e a obra, é impossível uma leitura completa de todas as possibilidades a uma primeira vista. A delimitação destes condicionantes se consolida em um processo sistêmico a fim de evidenciar tais realidades relevantes a obra. Bachelard fala que a imagem é inconsciente e ingênua amarrando a imagem a uma etapa pré pensamento lógico.

Ao adentrarmos nos tempos das ciências biológicas, criamos base consciente para compreender que o processo criativo é condicionado pelas estruturas mentais neurológicas de cada indivíduo. Mas também essa condição deve ser apoiada pelo adequado desenvolvimento de maturação de cada indivíduo. Tal apoio tem maior o menor impacto do ambiente criativo de modo individual, dependendo da sensibilidade de percepção do ente ao ambiente. Ao artista cabe atrelar a formação de uma mentalidade codificadora-decodificadora, a fim de criar uma capacidade seletiva da realidade. O fortalecimento deste hábito reforça as estruturas mentais favoráveis ao ente criativo, a capacidade de abstração e a imaginatividade. Faz-se então essencial, hoje embasado por argumento cientifico a valorização da técnica empregada intuitivamente na velha Escola de Belas Artes Francesa do esboço-esboço consolidando assim um processo cíclico. Tal processo não deve ser tomado por mera acumulação de elementos, mas sim um modo de multiplicá-los sistematicamente a fim de realizar mudanças progressivas. O caminho se dá por sucessivos reinícios, como se nada se preserve como definitivo, preservando um continuo estado intermediário libertário e criativo até a consolidação da obra. Durante o procedimento criativo, é fundamental para a síntese da compreensão que exista o diálogo entre o pensamento e a sensação; como resultado, obtemos o princípio da forma. Este exercício de síntese deve ser tomado de forma subjetiva e indireta, a fim de se fugir do formalismo óbvio.

Umas Poucas Palavras sobre o Velho Diógenes




Diógenes foi um filosofo grego que tomou notoriedade no mundo clássico por pregar uma vida sem grandes paixões. Muito próximo das idéias do budismo, onde a conquista do Nirvana passa pela negação do querer, da forma e da existência.

Esse sábio postulava que a ruína do homem auto-suficiente consistia no desejar. Suas principais indagações eram: afinal, por que querer uma carreira? Por que desejar o sucesso? Por que dedicar a vida a acumular bens e prazeres se esses são efêmeros? Não poderá um homem viver como simples homem em sua autonomia disso consistir sua felicidade?

Diógenes morava em um tonel nas ruas de Athenas, carregava uma lanterna em plena luz do dia na busca do homem verdadeiramente virtuoso. Trocava o pão do seu dia por algumas palavras de sabedoria que nunca excedia a compreensão de quem o alimentava.

Certa feita Alexandre Mágno em pessoa veio ao velho filosofo. E em tal ocasião o tentou ao oferecer qualquer coisa que ele poderia o fazer por ele. A resposta foi imediata: “Saia da minha frente, está ocultando meu sol. Não me tires o que não pode me dar!”. As palavras estavam a altura dos ouvidos do pupilo de Aristóteles. Ao escutar os comentários maldosos de seus oficiais Alexandre falou: “Se eu não fosse Alexandre, queria ser Diógenes”.

Oi amigos...

Inicio agora a aventurar-me nesse Blog com a intenção de dedicar esse espaço aos trabalhos acadêmicos orientados por meus mestres no decorres deste semestre 2009/2; assim como as demais coisas que perturbarem minha pobre alma neste hiato. Caso achem isso monótono, fazer o que... Não leiam...

Abraços...