sábado, 3 de novembro de 2012

Zumbi, e a necrose da alma.



Ontem um amigo meu que é jornalista me perguntou se eu já havia notado o quanto Zumbis estão na moda. Sou filho da geração de 80. Nasci em um uma época que os deuses já estavam mortos e os últimos heróis vivos haviam se prostituído, então todos nos também desistimos de lutar. Tendo ficado já passado na história as gerações dos perturbados Bitnicks, dos complacentes Hippies e dos apocalípticos Punks tivemos que encontrar nossa identidade própria. Corríamos sem saber para o lugar onde iríamos chegar, mas tínhamos a certeza que não era ali que queríamos ficar. Precisávamos fugir, ou como romântico Bocage falou: -Tenho muita saudade de todo o lugar de onde não estou.  Nesse palco dos anos 80, como rota de fuga, toma grande força o mito caribenho do Zumbi, que volta a estar na moda hoje. 
É meio desconcertante pensar em um corpo desprovido de alma que simplesmente existe, ou um ser humano morto-vivo. Vítima de das práticas do Vodoo, que no dialeto Dahomey quer dizer justo espiro. E como em toda crença africana, tal prática se manifesta de toda sua força em uma forma pura, autônoma e não maniqueísta. Derivado do cristianismo primitivo e de vários ritos africanos esse culto se edificou e difundiu por todo o caribe. Tendo origem na República do Haiti, sociedade onde os Houngan e as Mambo, os sacerdotes da prática, são ainda detentores de muito prestígio. Curiosamente é local onde também a primeira revolta escravista encontrou o terreno fértil para florescer.  Alguns antropólogos, estudiosos desse culto, afirmam que tais criaturas zumbis realmente existem. Porem também desmistificam tal fato. A prática vernácula de suas crenças os levou as toxinas de alguns sapos caribenhos que induzem as pessoas a catalepsia, demência e as terríveis necroses pela falta do contato com sistema nervoso periférico. Tornando um ser humano em um escravo da sugestão, pronto a atender aos caprichos de seu mestre.

Será que esquecemos da liberdade, na ânsia dessa fuga as idéias de escravidão voluntária, ou do poder originário, em cada dia que atamos uma gravata em nosso serviço! Focault aparte, eu acredito que isso transforme todos nos em zumbis de uma forma deliberada e aceita, e por fim vendemos nossa alma. Em uma época que os que dão as cartas hoje só temem as mesmas ideias da revolução francesa, inspirada na igualdade entre os homens. Talvez por isso, edificamos novos modelos de virtude como a "Revolução Verde" e o "Politicamente Correto", que hoje já não valem mais que carcaças dos heróis jazendo em um campo de batalha; assim como os druidas Celtas já praticavam... Hoje novamente nos vendemos nossas crenças em caixas cada vez menores e com melhores resoluções. Poderia a dinâmica geração de 80 ter se convertido em um bando de letárgicos zumbis? É certo que hoje vivemos em uma etapa meio retro perdida nos anos passados de 50, 60 ou 70... Nada mais que outro escapismo; que assim como nos temerarios antigos românticos de séculos passados, não me agrada em nada!

domingo, 3 de junho de 2012

Aquiles e Heitor

Aquiles ataca Heitor - obra de Peter Paul Rubens (1577-1640).


"Canto de ira, deusa, a destruidora ira de Aquiles, filho de Peleu, que trouxe incontáveis dores aos Aqueus, e mandou muitas almas valiosas de heróis a Hades, enquanto seus corpos serviam de alimento para os cães e pássaros, e a vontade de Zeus foi feita ..." (introdutório de a Ilíada de Homero)

Fiquei surpreso ao ver o post de um bom irmão de armas que explicitava as diferenças entre os “pés pretos”(soldados comuns) e aqueles que usam “botas marrons”(forças especiais); e muitas existem, sim. Na mesma hora me subiu a mente alguns tercetos do canto de Homero na Ilíada, e aquilo que a história guardou para Aquiles e Heitor.
Acredito que a batalha entre esses dois heróis é o ápice da primeira guerra de proporções épicas da história. Páris, cego pelo amor, dá início ao maior drama da antiguidade clássica ao conquistar Helena, mulher de Menelau irmão de Agamenon. Assim se faz um cerco de dez anos a cidade de tróia, fato que queimaria a memória ocidental de tal forma que atravessaria vivo milênios.
Ocorre que Pátroclo, amante de Aquiles, pede emprestada a armadura desse herói para liderar um ataque. A escaramuça funciona, os troianos acreditam estar enfrentado Aquiles. Mas isso também desperta a atenção de Heitor, que encontra com Pátroclo em campo de batalha. O herói troiano abate no campo da honra o primo do maior dos guerreiros gregos.   
Tal fato ensandece a alma de Aquiles, que já pensava em desistir do cerco, entretanto, a vingança do amante lhe delega uma nova motivação. Aquiles desafia Heitor para um duelo no nono ano de guerra. Heitor, o bom soldado, imagina que essa seria uma oportunidade de por fim no combate, assegurando assim a liberdade para aqueles que ele amava.   
Aquiles, descendente de Zeus, facilmente atravessa sua lança na garganta de Heitor. Não satisfeito com isso, amarra o corpo de Heitor a sua biga e o arrasta ao redor das muralhas de Tróia. Negar o túmulo ao homem antigo era o pior dos castigos, pois para eles a existência acabaria na falta da lembrança.
 Então se dá a passagem mais tocante de todo o livro. Príamo, bom rei de Tróia, pai de Heitor, vai ao acampamento de Aquiles durante a noite. Em um dialogo marcante lhe pergunta se seu filho morto lhe foi desleal, se ele não o honrou em batalha, e porque negava para esse homem a sepultura. Aquiles, ao ver justiça nas palavras do velho rei entrega o corpo de Heitor aos troianos.    
Imagino que sempre existiram dois tipos de soldados. Um como Aquiles, que luta pelas cores da gloria e notoriedade; e outro como Heitor, que pensa em garantir a segurança de sua família e dos que cerram fileiras ao seu lado. Ao pé preto sempre foi reservada a maior carga; se manter firme junto as trincheiras. Esse último, diferente do outro, não luta por glória, riqueza ou notoriedade. Ele já sabe que elas nunca lhe virão. Entretanto, acreditam que mesmo o seu maior sacrifício será mais uma expressão de sua inconformidade contra a opressão dos seus.
No tempo que passei em armas, sempre quando amarrei minhas botas pretas o fiz pensando no colega que estava no posto com as falanges enrijecidas, ou em minha família em casa. Pois entendia a nossa senda era feita de pedras. Também sabia que sem o “pé preto” o nobre “boot marom” jamais teria sua gloria...
O mais curioso desse canto é que justo Páris mata Aquiles, quando a cidade de Príamo cai por terra. Pagando assim uma fatura zerada ne seus atos por conta desse ter roubado a virtude da beleza de Menelau, e também, avivando o mérito da engenhosidade de Ulisses. Provando, também, mais uma vez, que o amor é uma arma mais forte que a espada. Assim como, que independete da cor de suas botas, se não tiveres cultivado a mesma paixão de Páris, de nada batalha alguma vai lhe valer...      

terça-feira, 8 de março de 2011

Orfeu, e o caminho do artista.


Orfeu era um músico primoroso que, junto a Jasão, buscou o Velo de Ouro em uma terra distante no além mar. Terra essa, que em um exercício de imaginação, e fantasia, bem poderia bem ser nossa boa Terra Brasilis; local onde seu povo cordial não conhecia a guerra e amavam a música. Mas não é sobre as peripécias de Jasão, e seus Argonautas, que me desequilibra ao exercício da escrita hoje. Mas sim a data carnavalesca, que já faz parte, profanamente, de nossas mais enraizadas tradições populares. Para tal fecha  lembro do feito desse herói, em sua maior aventura, no reino de Hades. Zelando pela vida de sua amada, foi uma das poucas personalidades, fora as do panteão maior grego, que visitou o reino dos mortos e voltou. Cabe, aqui, também lembrar que a palavra “música” para os gregos antigos não divergia da palavra “magia”.
Eurídice era a senhora do amor de Orfeu. Uma ninfa que era possuidora de uma beleza impar. Dadiva realmente duvidosa para qualquer moça, dado que logo sua virtude atraiu Aristeu, também filho de Apolo, e mestre dos apicultores. O asco da ninfa pelo meio-irmão de Orfeu era tanto que ao escapar de uma de suas invertidas Eurídice é picada fatalmente por uma cobra, e assim adentra no reino de Hades.
Inconfortável com a perda de sua musa, Orfeu decide o impensável... Barganharia com Hades a existência carnal de sua esposa. Uma jornada de provações se apresenta ao herói. Já nas portas do reino dos mortos cativa Cérberos com sua música, monstruoso cão de tricéfalo que guardava o Trátaro, guardião garantidor que nada passasse por seus umbrais. Após testemunhar os horrores guardados aos que cultivaram uma vida sem brilho, ele adentra nos Campos Elísios e executa sua mais comovente peça para o rei dos mortos, irmão de Zeus. Tocado com o sentimento da obra de Orfeu, Hades pela primeira vez experimenta o sentimento humano da compaixão, e chora. Concede ao músico a oportunidade de resgate de sua musa, mas impõe uma condição: Que ela o siga, mas que ele nunca olhe para trás para para se assegurar que sua amada lhe acompanhava. Passam eles pelas agruras do regresso, sem ele saber se ela estava em seu encalço. Mas pouco antes de saírem, Orfeu se rende a dúvida, ele olha para ver se sua esposa ainda lhe seguia. Erro fatal que garante a alma de Eurídice novamente volte para a terra de Hades, local onde, fora Leônidas, jamais mortal algum escapou. Completando, assim, a tragédia do músico primordial.
Aqui acaba a história de Orfeu. Mas não deixo de me questionar sobre suas implicações. Será possível que um artista jamais terá retorno correto, e confiável, de sua obra? E se caso ele o procure, deixará esse de ser verdadeiro artista? Fato estranho alude o mito, e a autenticidade na obra de um homem... Mesmo quando amamos, não podemos deixar de sermos fieis aos nossos sentimentos e convicções. Talvez nisso resida a maior grandeza da alma do artista, a crença em sua autonomia em sentimentos.


terça-feira, 4 de janeiro de 2011

O Mar e suas Possibilidades.

O respeito pelo mar sempre marcou o homem antigo. Nele residia seus maiores medos, desafios e limites. Mas também vinha do mar as melhores recompensas assim como seu sustento. Essa relação se manteve inabalada até os meados das guerras da era moderna, onde o domínio do mar edificou impérios como o Luso e o Espanhol e posteriormente o Britânico. Ao escrever isso me sobem a mente das palavras de Cristóvão Colombo: -O mar traz novas possibilidades aos homens; assim como o sono traz novos sonhos... Nesse cenário dualístico entre a ruína e a fortuna, os valores dos antigos gregos foram moldados. A relação de respeito e força destes homens antigos fica expressas em uma antiga oração de marinheiro, que dizia algo mais ou menos assim:


"Netuno, senhor dos mares.

Minha pujança é o senhor quem forjou, meu sustento vem de sua casa.

Mas se for por sua vontade, podes levantar o mar e me destruir.

Sou impotente fronte sua força; e grato por sua providência.

Em ambas situações, tudo o que eu posso fazer é o mesmo.

Manter-me firme junto ao leme..."


Nas muitas Américas somos um povo formado de muitos povos. Nessa diversidade pouco existe em comum em idiossincrasias etnológicas. Pouco em comum reside também nos motivos que trouxeram os nossos primeiros antepassados para essa terra. Fora a coragem de homens e mulheres em atravessar um oceano de provações em embarcações precárias. Esses temerários imigrantes viveram uma diáspora em busca da edificação de um sonho que residia no além mar. Tais pessoas, deixaram seus ossos no pavimento abaixo dos pilares de nossa civilização. Tornando-se assim um exemplo do último período da antiga oração. Afinal, tanto na dor quanto na fortuna, esses exerceram o vigor de se manterem no leme de suas escolhas.

quinta-feira, 22 de abril de 2010

Ser bom é fácil; o difícil é se manter justo.



Fiquei surpreso, semana passada, ao ler na camisa de um colega na universidade o dito: “-Ser bom é fácil; o difícil é se manter justo.”.


Diz uma antiga parábola que Licurgo, legislador espartano, certa feita foi provocado a realizar um palestra sobre os benefícios da educação. Pedindo um rato de tempo, o velho sábio se preparou para tal palestra.


Passado esse hiato retorna a agoras munido de duas gaiolas. Cada uma um lodos e também carregava dois coelhos nas mãos. Ao libertar o primeiro coelho ele liberta também o primeiro lobo. Imediatamente se dá frenética luta pela vida onde o coelho é implacavelmente devorado pelo lobo. Após guardar o animal ele repete novamente a experiência, desta vez com a segunda besta. A mesma cena de perseguição agita a agoras. Só que desta vez o lobo ao capturar o roedor prazerosamente brinca com sua presa, sem lhe fazer mal algum. Ficava assim demonstrado, brilhantemente, os benefícios da educação. O lobo, adestrado, foi incapaz de seguir seus instintos predatórios e devorar o afortunado leporídeo.


Tal coisa é impressionante na natureza, Skinner e Pavlov à parte, o condicionamento é capaz de fazer mesmo uma besta lupídia ter um comportamento bom e urbanizado aos olhos humanos. Ainda assim, o condicionamento a uma resposta é um processo mental inerente a qualquer criatura na natureza. Já o conceito de justiça, esse postulado de um processo mental mais elaborado, não ocorre de modo tão imediato ao comportamento. Afinal, sobre fria análise, que senso de justiça existe na segunda predação da fábula? E arriscando ir um pouco mais além, onde existe o ponto de intercessão entre os campos da educação, justiça e urbanisidade?

Em fim, fazer lobos e coelhos se comportarem bem é fácil. O difícil mesmo é fazer isso e não desequilibrar a relação justa entre lupus e leporídeos...

quarta-feira, 24 de março de 2010

A Mediação das Bruxas.



No fim da era européia medieval se vivia a formação de um novo inconsciente coletivo. O mundo ocidental emergia da idade das trevas, contudo o fervor religioso ainda ditava a ordem social. Paradoxalmente, neste período de fé na palavra de Cristo, fundamentadas no amor e na compaixão, as espadas possuíam afiação maior que a pregação religiosa. O conflito entre as não tão diferentes doutrinas católicas e protestantes lavava o solo europeu com o sangue de um número incontável de fiéis de ambos os lados.


Em uma época onde a crença era inabalável se fazia natural que essa determinasse as concepções de universo. Atribuindo neste placo tanto o bem e quanto o mal a uma esfera etérea na qual a sua concretização se só era possível através da influência mística. Fazendo parte do tablado histórico um rico jogo de cenários de batalhas entre a diabolicidade e a santidade. Tal fato fomentou um fantástico repertório folclórico europeu, sendo um dos mais fascinantes dentre esse a Bruxaria. Nesta dança espectral, entre a salvação e a corrupção da alma, a bruxa foi tomada como personificação máxima do poder das trevas sobre o ser humano. Curiosamente aceita unanimemente entre cristãos tanto católicos como protestantes.


Quando existia alguma tragédia, desavença ou simples infortúnio social ou familiar imediatamente tinha inicio a uma caçada as bruxas. As acusações eram muitas vezes mera forma vingança de alguma rixa particular. O processo de captura de uma bruxa se assemelhava em mecanismo como o da confirmação de um avistamento de OVNI na segunda metade do século XX. Assim que tal fato incendiasse em uma região, tomava força e crescia em afirmações de veracidade. Entre 1450 e 1750 foram registradas mais de 100.000 capturas de bruxas “confirmadas”. Havia, entretanto, um padrão na distribuição a atividade da bruxaria, que era muito mais ativa em regiões onde existia fronteira entre católicos e protestantes, Escócia; leste da França; assim como existia o alarmante índice de uma a cada três bruxas residirem na Alemanha. Também havia um padrão social associado. As bruxas eram em sua maioria mulheres viúvas ou solteiras, velhas, desfiguradas, pobres e quase sempre tinham casos de brigas com os visinhos. Contudo também não eram raros os casos de mulheres bonitas, homens com o perfil intelectual aguçado e até crianças encrenqueiras. Fica evidente que esses constituem tanto áreas como indivíduos muito mais propensos aos atritos pessoais do que o normal. Seja como fosse, assim que alguém não agüentasse mais os próprios contra-tempos e gritasse “-Bruxa!!!” alguém acabava cozido na fogueira. Assim a paz e tranqüilidade era recobrada no condado, pelo menos momentaneamente...


Infelizmente quando deixamos de acreditar em bruxas, nos idos da revolução industrial, perdemos também a fé na capacidade maligna do homem. Bastava ser cristão e de boa família para esse indivíduo ser promovido ao status de um portador do bem e dos bons costumes. O fruto amargo deste julgamento foi o mundo imergir nas aterradoras Guerras Imperiais, culminando com a I GG e seu desdobramento a II GG.


Hoje é muito comum voltamos a procurar culpados, ao invés de elucidar as possíveis causas de problemas. A igreja católica conclama nesta semana um “exército de exorcistas” a fim de apaziguar o crescente domínio do mal sobre a terra. Lembro-me do período de Guimarães Rosa, em Grande Sertão : Veredas: “Do Demo? Não gloso. Senhor pergunte aos moradores. Em falso receio, desfalam o nome dele – Dizem só: o Que-Diga. Vôte! não... Quem muito se evita se convive.”.

E nessa mediação maniqueísta entre o bem e o mal, arrastada por séculos, não tiramos ainda a nossa medida exata. Será que já tendo o estado humano pendido entre os dois lados extremos do mesmo problema ainda somos incapazes de formular essa síntese de tão violento conflito entre tese e antítese? Ou o pior, anda não amadurecemos o suficiente como sociedade para relacionar meras causas motivadoras mesquinhas a conseqüências funestas.
Acredito que o exercício da última reflexão é ainda um tanto agressivo ao espírito humano. Pois levanta o foco sobre uma óptica onde o indivíduo é vislumbrado como um ser capaz tanto de fazer o bem como o mal. Afinal, saber que quando observados de perto todos nós temos defeitos é relativamente fácil de aceitar. Contudo, observar as próprias limitações e tentar sana-las para a edificação de uma sociedade mais justa é um bocado mais difícil, não é mesmo?

terça-feira, 16 de fevereiro de 2010

A geração posterior...




A segunda grande guerra foi motivadora da mias profunda ruptura social em nível de um passado recente. Nada se compara recentemente ao esforço de toda uma geração que adentrava e escrevia a tinta vermelha uma das mais pesadas paginas da história humana. Contudo, as sinistras luzes do palco europeu, assim como os sons da devastadora era nuclear no oriente ofuscou toda a geração posterior. Neste hiato se fundamentou o inicio da cultura underground, e deste vácuo social alimentavam toda uma nova forma de arte e de se pensar a vida. Juntado passos a Ernest Hemingway, Jack Kerouac e as demais genialidades brilhantes fomentadoras da geração beatnik simplesmente levavam em frente suas existências. Tal grupo, tomados pela sociedade por não mais que um bando de vagabundos errantes, não tinha grandes pretensões, contudo, finalmente a parte do estremo norte da América firmava os primeiros passos em uma forma de cultura original..
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sábado, 6 de fevereiro de 2010

Um Erro Além do Horizonte



Comumente ao pensarmos sobre o período temporal da Antiguidade Clássica, talvez induzidos pelo nome, nossa mente é povoada por Gregos e Romanos, em uma esfera mental mais externa; Sumério e Egípcios, em um nível mais profundo. Junto a esses, no máximo, adicionamos alguns povos semi-barbaros, que hora sim, hora não, reivindicavam o brilho máximo de um talentoso coadjuvante na escrita da história. Tal qual as montanhas que cobriam nossa vista essa imagem mental de civilização ainda esconde o magnífico Império que era edificado as margens do Rio Amarelo. Possuidores de um espírito inventivo impar os Chineses estavam muito a frente do ocidente em tal época. Nesse período Confúcio dava os seus primeiros passos na província de Shandong. O papel era manufaturado em larga escala a ponto de ao passar de poucas décadas a imprensa ter se fundamentado neste solo através de técnica de xilogravuras. Propiciando não só que as idéias fossem difundidas nos séculos subseqüentes, mas também fomentado a alfabetização de toda uma classe operária. Todo o candidato a serviço público possuía uma cópia do livro contendo os preceitos de Confúcio assim como outro com a doutrina Budista. Possuíam um manual agrícola, largamente difundido entre os fazendeiros que mostrava como aprimorar, manipular e selecionar sementes. Iniciaram não só a construção da grande muralha, como também possuíam um canal artificial igualmente colossal onde escoavam a produção agrícola de maneira ágil e segura. Seus alquimistas ensaiavam os primeiros experimentos com pólvora. Desenvolveram várias técnicas de navegação. Foram os primeiros a edificaram pontes suspensas por correntes. No campo da medicina eram virtuosos fitoterápiticos e também foram os primeiros a identificar doenças relacionadas ao trabalho. Na metalurgia nada deviam as forjas Germânicas medievais, mesmo estando separados por séculos de antecedência.


Sob tal óptica poderíamos vir a concluir que essa sociedade corria a passos largos a revolução industrial antes mesmo do inocente ocidente adentrar na alta idade média. Fato é que tal coisa nunca ocorreu. Acontecimento estranho aos olhos ocidentais. Contudo facilmente explicável. Eram cartógrafos primorosos, contudo a escala era guardada a representar tão somente pequenas vilas e propriedades rurais. Suas terras e cultivos eram ricos, acreditavam estar sitiados no jardim da humanidade, nada de melhor poderia existir além de suas cidadelas. Eram hábeis marinheiros, é fato que inventaram a bússola, contudo se dedicavam simplesmente a navegação de cabotagem. Quando Colombo arriscava as primeiras tentativas de circulo navegação anda os cientistas Chineses tinham a convicção que o mundo era plano e que a China era seu centro. Fora isso nenhum outro empecilho tecnológico impedia a China ter chegado a América em pleno período ocidental clássico.


Tais idílios podem ter fundamento no budismo, doutrina que prega a certo conformismo de alma e ambição. Contudo a mim parece que o pecado maior dessa magnífica civilização foi a total incapacidade de sonhar, a temerária precariedade no ato de se reinventar em um processo cíclico. Não por medo de arriscar algo maior, mas sim pela plena certeza de já possuírem tudo que poderiam vir a querer. Não me causa espanto saber que a pequena tribo dos Mongóis, não mais que um rato que rugia alto de dentro de uma garrafa no coração da Ásia, os subjugaram de tão fácil mente. Esses atrevidos cavaleiros tiveram a genialidade de apresentar o mais nocivo elemento ao Império Chinês, ou a qualquer outra sociedade sedimentada; eles trouxeram o “novo”.

quinta-feira, 28 de janeiro de 2010

Medice, cura te ipsum.



Quiron, o mais racional dos centáturos, foi o instrutor de vários heróis clássicos. Assim se fazendo o primeiro educador da antiguidade clássica. Virtuoso, tanto na arte da guerra e da lógica quanto da medicina. Fato curioso alude a não só a vida mas, sobre tudo, também a despedida desta divindade.
Em certa feita Quiron foi visitado pelo seu amigo Heracles, para a feliz ocasião velho professor manda que seja servido um odre de vinho. O aroma da bebida aguçou a cobiça dos demais centauros, selvagens e muito hostis ao homem. Dá-se fantástica batalha onde Heracles, armado de suas flechas envenenadas pelo sangue da Hidra Lerna, abate todos os centauros agressores. Infelizmente no afã da batalha fere acidentalmente o bom amigo Quiron. O Centauro, filho de Cronos, é imortal. Contudo o veneno da Hidra garante que o ferimento nunca feche, algo que estava muito além dos conhecimentos de cura do médico primordial. Não suportando a dor o velho Centauro renuncia a sua imortalidade e vai ao encontro do fim de seu enorme sofrimento entrando no reino dos mortos. Lembrando que o preço da imortalidade não é mais que a vergonha ou a dor eterna.
Tal mito me faz lembrar as considerações de Descartes sobre a eternidade e a imortalidade. Coisa que ele definia como uma piada de muito mal gosto caso se mostrassem verdadeiras. Mas não é sobre isso que venho em escrever hoje, e sim sobre o título do post: “Medice, cura te ipsum”(Médico, cura-te a ti mesmo) já presente no conto do mau médico de Ésquilo e que também aparece na doutrina cristã em Lucas 4.23, claras paródias do mito clássico.
Mitologia e religião à parte, fato é que hoje esquadrinhamos o organismo humano com maestria. Biólogos descobrem formas de enganarmos ao envelhecimentos, fiscos médicos e biomoleculares atuam em nível atômico junto as nossas células redesenhando proteínas e arquitetando mudanças no DNA. Em suma, somos capazes de construir ou desconstuir um ser humano na integra através do projeto genoma. Livro que escrevemos mas que temos tanta dificuldade para ler e produzir interpretação; estranho como isso é natural hoje... Identificamos e atuamos em dimensões nanométricas no corpo do individuo. Contudo, pouco sabemos do ente e da sua coletividade, a humanidade.
Tudo isso faz parte da maravilhosa idade pós-moderna em que vivemos. Porem não é pena que nossa concepção cientifica mecanicista tenha lançado visão sobre o homem e não sobre a humanidade. Essa última muito mais velha que qualquer um individuo ainda reside indômata em sua caminhada permeada de erros e acertos, em seu lento e gradual processo social evolutivo; imaculada junto a desejos, ânsias e aspirações. Por isso agradeço a tal fato, com o grato alívio libertário, de me entender ainda parte de algo que não foi aprisionado e analisado dentro de um tubo de ensaio sobre a prerrogativa gelada das lentes de um microscópio.

segunda-feira, 21 de dezembro de 2009

EDWARD HOPPER: RETRATOS DO INIDIVIDUALISMO URBANO.

Círio J. Simon

Não existe solidão maior que a companhia de um Paulistano.

Nelson Rodrigues.

RESUMO:

Ao adentrarmos no estudo da obra de Hopper devemos compreender que sua produção é pautada por diversos aspectos psicológicos e sociológicos da construção de um novo inconsciente coletivo do homem urbano do início do século passado. A vida nas grandes cidades pós-primeira guerra abandonava os últimos resquícios culturais do período social urbano colonial vitoriano. A quebra da bolsa de valores de Nova York no período do entre guerras e a impressão de impotência do trabalhador urbano jogado fronte a um mecanismo macro-financeiro fez fortalecer os sindicatos trabalhistas que marcavam em tintas vermelhas o período da depressão norte-americana. As idéias e teorias de Freud se popularizavam ao passo que o homem deixava de ser visto como um ser puramente social e tornava-se, cada vez mais, um ente que se posiciona e reage de modo particular e pessoal perante a sociedade. A massificação impessoal urbana aos poucos destruía os núcleos de convívio comum, mais próprio, neste momento, das pequenas cidades rurais. O individualismo social, a perda da identidade coletiva e a falta de esperança no futuro comunitário transformavam fortemente o plano sociológico de época. Nesta conjuntura cultural Edward Hopper encontrou terreno fértil para o florescimento de sua arte. Sua obra é impregnada dessas características, forjando assim um retrato fiel da sociedade norte-americana do alvorecer do século XX.

PALAVRES-CHAVE: Edward Hopper, Arte, Urbanismo, Norte América.

1 CONTEXTO HÍSTORICO

A sociedade sofria marcante reformulação no período entre-guerras. Como conseqüência do esforço de guerra, a Europa vivenciara um surto científico e tecnológico. As idéias do alemão Karl Marx ganhavam forças sob a luz do luar do oriente europeu. As classes operárias européias, já bastante castigadas pelo esforço de guerra e pela falência do sistema monetário industrial imperialista, vislumbravam tais idéias como uma nova possibilidade de sociedade mais igualitária.

A revitalização da indústria norte-americana fomenta uma nova onda de imigração de mão de obra para o novo mundo. Essa esculpia a marcantes cinzeladas um novo perfil para os antigos centros urbanos estadunidenses. Trouxeram consigo, esses imigrantes europeus, um pouco mais que suas ferramentas de trabalho; em seu rol de pertences também existia um privilegiado espaço para sua bagagem cultural. Muito desta constituída de hábitos e costumes, alguns deles fundamentados no berço do comunismo e do anarquismo. Esse aparente idílio de igualitarismo na verdade enraizavam no concreto urbano os primeiros brotos do individualismo metropolitano. Contudo, por se tratar de uma diáspora da classe trabalhadora, a arte norte-americana ainda assim se mantinha relativamente imaculada ao “avant-guarte” europeu. Na mesma época surgia nos subterrâneos da 5° Av. em Nova York um grupo de artistas que, com seus pinceis, a traços ágeis, delineariam os tons de uma nova vertente do realismo fotográfico, galgada sobre o seletismo da realidade representada. Esses ficaram conhecidos como o grupo do “The Eigth” e grande parte de seu trabalho era dedicado ao retrato poético dos maginalizados nos guetos de Nova York. Fruto deste embrião artístico fecundado nos porões da Times Square, a arte de Hopper torna-se um forte expoente da identidade cultural urbana norte-americana.

2. A OBRA

Um marco importante na vida de Edward Hopper foi a aquisição de seu primeiro veículo, tal fato não só veio a ser motivador do encurtamento das distância, mas também um propiciador de expansão dos seus horizontes culturais. Junto à sua esposa Josphine, costumeiramente embarcados em seu velho Dodge, experimentaram sabores e impressões que iam do frio gélido da tundra canadense ao tórrido calor dos desertos mexicanos. Essa viagem “On the Road” não só evidenciou a formalidade da solidão da vida moderna, mas também propiciou o contato com demais intelectuais da incipiente cultura underground, entre eles o próprio beatnik Jack Kerouac. A experiência “na estrada” que Hopper vivenciou, junto a Kerouac, evidencia a relação de individualidade e solidão do trabalhar ante ao serviço e suas possibilidades. Fomentado o sentimento de individualismo do ente, imerso na era pós–industrial, ante ao universo que são mutuamente abandonados(Fig. 1 e 2).



(Fig 1. Estudo preliminar, Gasolina - 1940)

(Fig 2. Gasolina.)

Nessa senda Hopper percebeu que as estradas não como um meio de união entre dois centros urbanos, mas sim uma via física que reproduzia involuntariamente a falta de comunicação entre, e nos, diversos núcleos familiares de uma cidade. Tal experiência leva essas vias a se tornar um série de crônicas visuais de “Não Lugares”, pontos onde a história e a identidade são negadas. Quarto de hotel, evidência a solidão no espaço urbano sem memória(Fig. 3). Junto a esses está inerente hotéis, aeroportos e demais vais que por não possuírem memória própria, dicotomicamente, segundo Salavisa, se apresentam em um caráter universal e familiar ao viajante.

Neste cenário efêmero se dá a obra de Hopper, em um ambiente transitório edificado por uma sociedade onde a comunidade não é mais tão importante quanto o serviço e que o “Eu” que alheio percebe não mais que o universo imediato, contudo nada registra. Em Night Hawks, fica presente não só o individualismo das pessoas retratadas “que não se olham” também a intenção de interação predatória de serviço prestado. Fica evidente a exclusão de todas as demais pessoas das ruas da cidade de Nova York que não tem a ver com o momento(Fig. 4).


(Fig. 4. Night Hawks)

A falta de uma identidade fomenta o sentimento quase nômade de constante mudança de sitio. Lembrando a frase de um dos influenciadores da obra de Hopper, Baudelaire: creio que estaria sempre bem onde não estou. Neste contexto se da a necessidade de formação de critério pessoal interno e por isso a intenção do recolhimento monástico a espaços urbanos impessoais a fim de satisfazer a compulsão a reflexão. Tal melancolia e solidão criam o contra-ponto, impulsionam e perspectivam o raciocínio individual. Aspectos como direcionamento iluminação e a mínima presença de decoração são normalizados e isolados projetando o individuo em sua busca. Toda a possibilidade de aprisionamento do ente no local onde ele se encontra é removida, ressaltando assim não só o distanciamento local, mas também, o mental do ser que busca por respostas pessoais a suas indagações. Em Morning Sun vemos a impessoalidade do ambiente na completa falta de decoração do quarto, as paredes são nuas, desprovidas mesmo de tinta, não existem cortinas ou persianas. Tudo que roube a atenção e não seja essencial a solidão própria para a reflexão é subtraído.



Hopper mantinha um relação explorador de espaços urbanos, entendia o individualismo das metrópoles, contudo não era um aventureiro desvairado. Mas sim uma pessoa próxima aos ideais fomentados pelo individualismo da geração pós-guerra beatnik, altamente intelectualizada, que buscava o isolamento pessoal e como decorrência dos fatores sociais anteriores abandonara por vez o sentimento de coletividade. Tais sentimentos podem também ser vislumbrados em sua obra. Em Approaching a City mostra não só um momento individual de percepção do trem que está prestes a rasgar as entranhas da cidade via subway adentrando em Nova York, como também revela a ânsia por ser jogado um desconhecido paradoxalmente já cotidiano(Fig. 6).

(Fig. 6. Approaching a City)

Muito do ferramental técnico de Hopper era constituído por artifícios arquitetônicos: expressividade de traçado, noções de perspectiva arquitetônica, simplificação de representatividade tanto formal como de luz-sombra e técnicas de apelo psicológico para a construção de sentimentos espaciais. Fomentando tais sentimento, segundo o Dr. Círio Simon, Hopper usa a técnica média-extrema-razão. Onde o primeiro plano é deixado vazio para evidenciar amplitude, solidão e desacolhimento(Fig. 7). Na representação podemos sentir o vazio em primeiro plano. A técnica pode vista nas proporções guardadas no quatro. Hopper ao privilegiar o espaço vazio no centro remete o interlocutor a melancolia da inexistência de forma(Fig. 9). Essa relação com a arquitetura gerou forte crítica de seus contemporâneos, sendo por algum tempo tomado pelos erodidos como um artista menor. Condição que só veio a mudar com o advento posterior da Pop-Art.




Tal relação com a Arquitetura não se limita as técnicas utilizadas, a própria arquitetura vernácula americana foi alvo de sua obra(Fig. 9). Essa como cenário de pano de fundo para a relação do indivíduo remetido a busca da individualidade ansiada pelo seu ego que se contrapõe ao trabalho coletivo em um centro urbano. Tais imagens sempre reforçam o parecer da busca individual do trabalhador abandonado ao seu inconsciente. vemos novamente o vazio valorizado, assim como o individuo remetido a não produção e ao próprio “Eu”(Fig. 10).



Mesmo os espaços urbanos públicos retratados pelo artista fica presente tais características psicologias do ente contraposto ante ao social, que em sua relação trabalhista com os demais membros da sociedade tem em ápice a negação de seu ego. Essa é a evidência máxima da perda da credibilidade das grandes metrópoles no futuro prometido pelo “Americam Way of Live” que prega que o individuo é super valorizado e libertariamente onipotente ante a sociedade, com resquício metabolisado dos ideais germinados pela mão de obra anarquistas advinda no entre-guerras que pregavam a edificação do “Eu” supramoral e suprasocial . Em New York Movie Hopper mostra a trabalhadora valorizada em segundo plano que presa a suas introspecções espera o fim da secção(Fig. 11). Em Barbershop o cotidiano de uma barbearia, onde o tempo se mostra parado na metáfora do relógio partido pela luz na parede(Fig. 12). Hopper retrata o barmen desamparado na solidão da passagem pública.(Fig. 13).




O artista também percebe o inicio da desconstrução da família nuclear em centros urbanos. Antes em pequenas cidades tendo sido tomada por cerne dos valores americanos, agora delegadas a simples grupos familiares que dividem e compartilham o mesmo lócus. Presos ao próprio individualismo compartilham o local, porem não existe evidência de interação entre os casais que habitam os mesmos espaços. Unidos somente pelo local e não pelas vidas, o artista demonstra que mesmo acompanhado o ser urbano está preso ao condicionamento das estruturas sociais vigentes na super valorização do ego. Em Room in New York vemos o casal que dividem o mesmo espaço porem novamente não interagem entre si(Fig. 14). Em Hotel by a Railroad novamente a permanência física porem o distanciamento mental do local(Fig. 15). Mesmo em cenários de relativa intimidade fica evidente que apenas as pessoas estão no lugar e seu psiques escapam para outros locais(Fig. 16)




3. CONSIDERAÇÕES FINAIS

Destarte, Hopper tece uma radiografia da sociedade norte-americana da primeira metade do século passado. Para tal feito compõe maestralmente um mosaico de pequenos, mas significativos, recortes da vida urbana. Em sua obra, firmemente pautada pela então ascendente teoria do inconsciente assim como pelos reflexos sociais de duas arrebatadoras guerras o artista nos remete ao cotidiano urbano. Contudo essa não é uma visão externa ou estereotipada de metrópoles que galopam a ágeis passos em dinamismo, progresso e velocidade; mas sim em um cotidiano vivenciado pelo ser urbanóide comum que massificado pelo sistema social tenta escapar física ou psicologicamente do local monótono onde se encontra, reforçando assim o individualismo do ente que se defronta com a sociedade que oprime seu ego. Tal obra é impressionantemente despida de estéticas primordiais ou técnicas refinadas o que delega ao conjunto da obra um traço de deliciosa humanidade. O artista também nos desequilibra ao evidenciar que mesmo acompanhado o ser humano tem a estranha propriedade de permanecer só, assinalando a tímidas pinceladas que solidão não é uma questão de companhia. Sua obra permanece atual, análise mais criteriosa da obra de Hopper pode vir a propor respostas edificantes para aqueles que tem como objetivo um planejamento urbano e social mais justo e humanizador.

quarta-feira, 14 de outubro de 2009

Huitzilopochtil, o Colibri Canhoto; Deus dos Guerreiros Esquecidos.





Nessa semana me deparei com um pequeno, mas recorrente, grupo de perguntas: Afinal, quem foram os Astecas? Qual eram suas técnicas, artes e mitos?

Ao iniciar o tratamento desta incomoda coceira intelectual, minha primeira descoberta foi a decepcionante conclusão do quanto não damos a devida importância a essa magnífica civilização. Existe realmente muito pouco escrito sob; e quando feito comumente tal assunto é abordado sobre forma fantasiosa, oscilando entre mitificações de contatos extra-terrestres e teorias apocalípticas. (Nada contra o pessoal da “nova era”, mas por vezes eu acho que o que eles tratam por “oculto” não é mais que eclipsar a beleza e a grandiosidade do espírito humano). A segunda foi a maravilhosa descoberta de um grupo social fomentador de uma cultura cujos ciência e arte era riquíssima e deliciosamente original. Uma sociedade repleta de concepções de universo bastante particulares, soluções imaginativas, iconografia fantástica, posuidora de medos, anseios e esperanças extraordinários ante a uma realidade desafiadora.

Mestres na solidificação da improvável teoria dos “sentimentos mistos”, sem dúvida, conheciam o ápice do termo culto sublime. Diderot, em uma carta a Sophie, indica esse termo como um misto entre o êxtase e o terrível. Para tal descreve uma cena onde uma linda mulher semi-nua oferece doce néctar alcoólico servido dentro do sangrento crânio de nosso inimigo. Essa imagem mental, apesar de toda valorização dos sentimentos antagônicos, tem um impacto mental pífio ante o ritual de sacramento de um rei em Tenochtitlan. Onde cerca de 70 mil prisioneiros foram sacrificados em um ritual que arrancava-se da cavidade tórax seus corações, ainda palpitantes, para serem oferecidos para Huitzilopochtli, o colibri-canhoto, Deus da guerra e dos vencidos. Após mortos, corpos pintados eram atirados aos espctadores sendo avidamente devorados por uma multidão em êxtase. Suas peles eram esfoladas e utilizadas como uma segunda pele do cidadão, que a usava até que apodrecesse, neste meio tempo o Asteca assumia a personalidade da vítima, e como esse deveria ser tratado pelos demais.

Eram grandes arquitetos que artificializam o terreno com pirâmides tão grandes como montanhas, transformando a paisagem tropical. Possuíam aquedutos, dominavam técnicas de irrigação, cantuária, orientação solar, edificação sobre palafitas a ponto de Tenochtitlan, edificada sobre um lago, foi classificada por arqueólogos como a Veneza do antigo Novo Mundo. Artistas singulares possuíam uma linguagem representativa pictórica rica e magnífica, muito da qual ainda não formamos concepção imaginativa adequada. No campo das ciências eram capazes de uma leitura astronômica primordial, elaboraram, embasados nesse conhecimento, um calendário mais preciso que o nosso atual gregoriano. Para tanto desenvolveram um linguagem matemática autentica, solidificada em um cordão com nós, que usavam para realizar cálculos e transmitir mensagens em meio as florestas do mundo pré-mexicano.

Tal civilização certamente não foi dada gratuitamente a selvagens por piedosos visitantes do espaço! Fora conquistado com o melhor que reside em nossas almas: esperança e agonia, erros e acertos, bondade e crueldade, ciência e fé, arte e destruição, trabalho e martírio... Somente assim enxergo como esse nômades realizaram no hiato de 200 anos o que Romanos e Egípcios levaram mais de 1000 para fazer. O mais irônico disto tudo é que a mesma cultura que os glorificou os destruiu. Quando Cortez desembarcou no novo continente tal fato catastroficamente coincidia com a profecia do retorno de Quetzalcoalt. Divindade branca de olhos azuis e barba longa que chega para ficar e dominar o mundo para sempre...